segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Cláudio e Ana.

A maquiagem borrada demonstrava uma cara nem um pouco bonita. Ana era linda em qualquer ocasião, mas agora sequer podia ser considerada Ana. Debaixo de tanta lama, bagunça e suor. Aquele copo de vinho na mão, o cigarro entre os dedos até que balbucia palavras roucas em meio ao choro.
- Lembra do que conversamos ontem?
Cláudio caminhava de um lado para outro da sala, percorria a cozinha e voltava até onde pudesse a enxergar na varanda. Já havia arremessado seu copo na parede, logo depois deu alguns murros que lhe doeram a mão. Já havia gritado, acordado os vizinhos e atendido o sindico dizendo que estava tudo bem. Depois de todo esse dramalhão, de ter tomado uma garrafa d'água, de ter enchido o pulmão de ar enquanto contava até 10 umas 100 vezes... Ele a respondeu. Cruzando os braços, enquanto ela de costas, despencada na varanda olhava a lua.
- Qual parte?
- A que você prometeu que nunca mais gritaria comigo daquela forma. E hoje fez pior, gritou mais alto do que gritara antes.
- Ontem eu não esperava ouvir o que você me disse hoje.
Ana se levantou, foi em direção a Cláudio, afundou o dedo em seu peitoral e quando olhava para cima procurando seu olhar, começou a falar com a voz irritantemente mimada.
- Então suas promessas são relativas? Não acho certo...
Ele a segurou pelos braços firmemente. Sério, permaneceu a encarando enquanto tirava seu corpo do chão. Ana nada fez, ainda em choque tentava encontrar o chão com as pontas dos dedos dos pés.
- Cala essa boca e para de falar merda nos meus ouvidos.
A soltou. Não havia o que dizer, não havia o que tentar entender. Tirando as forças do amor que tinha, Ana resolveu se calar. Não por obedecer, não por achar que realmente deveria fazer. Pelo simples e leve fato de não conseguir mais balbuciar uma palavra que fosse, sabendo que lhe voltaria como um punhal da boca de quem mais amava. Era patético, era desconcertante, eram todas as palavras esfrangalhadas do dicionário, que ela conhecesse. Saiu arrastando os pés pela casa até entrar no box, ligar o chuveiro e despencar no chão sem nenhuma feição aparente. Apenas a ausência de vida lhe correndo pelas veias. A água contra seu rosto mal era sentada, até que seus olhos se fecharam indo de encontro a um breu profundo. Não havia mais noção do tempo, espaço, tampouco separação de cidadãos, bens, costumes. Cláudio passou no corredor com um leve olhar superior apenas para averiguar o que se passava. Até que encarou o corpo muxo jogado ao chão. Correu quase quebrando com o corpo o vidro que o separava de Ana. Segurou seus braços, a pegou no colo e saiu já também encharcado, até o quarto. A pos na cama enquanto a mesma abria os olhos devagar, o puxou para si em um gemido baixo até que se encontraram as tais bocas sedentes, desesperadas e apaixonadas. Apenas buscando um ao outro numa fúria mútua.
- Me perdoa pequena, me perdoa...
- Está tudo bem, eu fui uma completa idiota.
- Você está bem? Eu fiquei preocupado quando te vi caída no banheiro.
Os dois se olharam, Cláudio a beijou segurando seu rosto e demonstrando o amor que ainda lhe pulsava no peito e arrepiava os pelos.
- Eu devia ter cumprido a minha promessa. Eu realmente não quero mais gritar daquela maneira com você. Não é dessa forma que eu quero tratar a mulher que eu amo.
Nem todas as brigas acabavam assim, ora ou outra muitos outros problemas vinham a tona. Mas por mais clichê que seja, enquanto o sentimento existe o respeito há de se fazer presente. No dia seguinte, lá estava ela, já radiando a luz de sempre com a camisa dele, preparando o café. Ele só de cueca lendo um jornal online. O sindico inventou uma desculpa para bater na porta, dizer qualquer coisa inútil só para fofocar para a vizinha do andar debaixo o que o casal aprontou na noite anterior para haver tanto barulho nesse apertamento. Ele atendeu a porta, sorriu bastante, foi educação. Mais receptivo do que o de costume e o sindico indagou sobre Ana.
- Seu José, não estou em trajes adequados.
Ela riu, se escondendo um pouco atrás de uma parede com uma frigideira nas mãos.
- O senhor já tomou café?
- Sim senhora. Mas obrigada! Era só isso mesmo, perdão pelo incomodo.
Cláudio acenou com a cabeça ainda sorrindo, fechou a porta e se encaminhou até Ana, quando a mesma pôs a frigideira no fogão, ele se certificou que nenhum acidente aconteceria e a puxou para si. Girou seu corpo até que ela o encarasse, apertou sua cintura, a pegou no colo e a mesma se rendeu ao seus encantos com facilidade, enlaçando as pernas em volta da sua cintura.
- Você está ficando louca? E se ele aceitasse?
- O que tem ele comer conosco?
- E como eu poderia fazer o que se passa na minha cabeça agora, na frente dele?
- Hum... E o que se passa na sua cabeça agora?
- Se aproxime e eu te conto.
Ana então se aproximou, entrando na dança e montando uma face de curiosa. Até que ouviu sussurros sacanas e arranhou as costas de Cláudio. O mesmo voltou a percorrer o caminho do quarto com Ana em seu colo.
- Louco!
- Louca!
Risadas ecoaram pela casa. Duraram pouco, só até outro som transcender do quarto para a casa. E seria sempre assim... Amor duradouro para sensações variáveis de períodos indetermináveis.

Nenhum comentário:

Postar um comentário