- Você se acha muito forte fazendo isso, não é? Se escondendo nessas paredes tão instáveis de orgulho. Fingindo não está nem aí quando por dentro meu silêncio te corrói.
E eu que nunca me calo, que sempre vou até o fim no máximo de minha voz. Dessa vez resolvi levantar, caminhar até a cozinha, pegar um copo de água, voltar e não fumar. Mesmo controlando toda aquela vontade. Resolvi fazer tudo diferente para que dessa vez a resolução também não fosse igual. Eu precisava de uma solução que não poderia passar dessa noite. Para que se deteriorar a cada palavra gasta ao vento? Se danificar entre xingamentos e ofensas tão subentendidas. No fundo trocamos as culpas para dizer que não erramos. Que não fomos nós que abandonamos essa barco. De que adianta? Naufragamos, não naufragamos?
- As vezes sinto que estamos como Chuck Noland em "Cast West" só que sem o Wilson.
- Que?
- Nada não.
- Do que você está falando?
- Deixa para lá. Releve. Você não releva o fundamental? Para que se preocupar com o superficial, logo agora?
Lá ia eu novamente, mergulhando nesse mar querendo que ele se afogasse. Para que apontar um dedo para o outro se quatro ainda estão virados para você? Ele não respondeu, eu agradeci mentalmente. Resolvi levantar e me encaminhar até a cozinha para outro copo d'água mesmo sem cede alguma. Não queria ficar ali, muito menos queria ele ali. Mas nós continuávamos, ou só eu continuava. Procurando um final feliz como se estivéssemos em um filme. Pobre menina sonhadora que ainda não aprendeu com tantos amores. Essa história de final feliz é mais lenda urbana do que história da carochinha. Voltei a sala e ele fumava. Me controlei para continuar sem.
- Você tem algo mais a dizer?
- Não.
- Nem eu.
- Então posso ir embora?
- Você já foi embora. Seu corpo não diz muito, para ser sincera... Não diz quase nada.
- Eu fui embora ou você me pôs para fora? O seu corpo disse muito.
Nos encaramos pela última vez, pus minhas ultimas forças para que isso acontecesse. Mas como ela era a pouca, o olhar também não durou muito. Ele se levantou e eu não o detive, mesmo uma mini eu se debatendo dentro do meu corpo e gritando a plenos pulmões que eu deveria fazer isso. Que meu corpo deveria reagir e lutar por ele. Esse não poderia ser o fim. Eu não queria me afogar. Eu não queria me matar. Mas não o fiz porque no fundo eu sabia que querendo ou não, já havia terminado. Não bebi nada além de água, não fumei e não o detive. Continuei quieta convencendo - ou tentando - a mim mesma que além de não ser um filme, isso também não é um texto. Que não existem pontos finais tão claros na vida real. As vezes outro parágrafo começa sem você perceber. E ao perceber que está em outro assunto, o choque acontece. Acontecerá. Aconteceu. É difícil entender que ele passará por aquela porta e não voltará. Não deixará sua camisa do Lanterna Verde comigo, não passará a mão nos meus cabelos e fará o café da manhã. Ele só irá sair por ali e me deixar aqui sem ele e sem o Wilson. Assim ele fez e assim eu permaneci. Sem fazer absolutamente nada.
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