sábado, 11 de fevereiro de 2012

Vamos, eu te levo para casa!

No começo nós bem que tentamos passar um pelo outro discretamente, no máximo um "tudo bem?" nos corredores de alguns bares. Nossos amigos entraram junto conosco nessa fuga utópica. E não foi fácil até conseguir realmente encarar seus olhos. Como não foi fácil para eles, montarem um calendário com datas revesadas entre eu e você para não nos obrigar ao encontro. Não adiantava muito, três saiam com você, dois comigo e logo depois já estávamos em sete bebendo. Eu quieta com meu copo de vinho e meu cigarro. Você apelando para algo mais eficiente na praça em frente ao bar. Me incomodava sua risada e aquela camisa que eu te dei de presente. Me incomodava a marca dos dias que pegou sol com nossa aliança e agora se tornara apenas um traço branco no dedo anular. Me incomodava aquele modo de explicar de música como eu te explicava. E comentava da faixa do CD que eu te dei enquanto eu tentava prestar atenção nos meus dedos e da forma compulsiva que eu descascava o esmalte pedindo a Deus para sair dali. Nesse momento eu pensava que você não acredita em Deus e minha mente automaticamente ligava você a todas as frases avulsas que poderiam me vir a mente. Desisti, paguei uma parte da conta e fui embora. Assim terminou a primeira tentativa, eu fugindo para casa enquanto sentia seu olhar sob meus ombros. Cheguei me perguntando o que estava fazendo e noque estava me tornando. Eu não era assim e não fazia esse tipo de coisa. E não é porque você foi embora que iria começar a agir diferente. Nas seguintes vezes participei de todas as conversas, ri, até trocamos algumas palavras e entramos em outras poucas discussões sobre qual versão de Fever era melhor. Até que o fato dele errar o nome da minha avó não me irritou mais. E até que éramos só nos dois na mesa bebendo e rindo sem nenhuma pretensão de transar. Sem eu olha-lo e imaginar sua boca em todas as partes do meu corpo e aquela língua quente... De resto, nada mais me vem a mente.
- Eu tenho sido bem forte desde que terminamos, sabe?
- Eu sei.
Eu queria que ele me agradecesse. Me dissesse que tenho sido forte por nós dois. Porque eu tinha sido! Dar o devido valor a dificuldade que passei tentando equilibrar o meu estado e o dele também. Nas vezes que não comentei, mas que o visitei de madrugada. Tomávamos um vinho, detonávamos uns maços de cigarro já pela metade de outros dias. E aí você cheirava meu pescoço enquanto meu corpo se derretia nas suas mãos e eu sabia que era hora de pegar minha bolsa e sair pela porta. Nunca ficava e me perguntava se esse era um sinal que a sensação não era suficiente. Você insistia, dizia que eu podia ficar. Mas quantas vezes por optar ficar e mais duas garrafas, nós voltamos? Depois descobríamos que isso não solucionava nossos problemas e voltava todo aquele mesmo inferno que nos atirávamos e permanecíamos. Nesse exato momento aqui, bebendo esse seu drink caríssimo que eu nunca te deixava comprar. Fumando o seu cigarro que me deixa tonta. Agora, aqui, você deveria me agradecer por ser forte por nós...
Ele fez sinal pedindo a conta e mal contive minha feição interrogativa.
- Acabamos de chegar.
- Eu quero ir embora.
- Está acontecendo alguma coisa?
- Eu quero ir embora daqui e de você.
Não soube o que responder, se derretia o cubo de gero que me tornara para chorar a dor que me rasgava o peito e calada permanecia, trancafiada enquanto eu nos mantinha. Ou apenas o encarava sem saber o que dizer, tampouco o que fazer. Então ele continuou em tom baixo, penetrante. A mão espalmada na mesa e os olhos penetrantes que me faziam querer sumir como na primeira tentativa. Atravessar aquela porta correndo sem nem lembrar da bolsa.
- Você foi forte demais, você foi forte por nós. E quem disse que eu queria toda essa força? Eu queria a sua fraqueza, a fraqueza que tremia em minhas mãos e que pulava no meu colo quando meus olhos começavam a marejar pelo simples fato de você saber que eu nunca, nunca choro!
- Escuta aqui. Você pode me acusar de tudo, menos de não ter sido plenamente humana e até cuidadosa contigo. Eu te dei amor, eu te dei carinho, eu te expliquei e re-expliquei cada palavra que me fez abandonar essa doença que éramos. Eu cuidei de você até você se reconstituir.
- Eu não falei que você não foi cuidadosa, você foi. Mas o amor nos enfraquece, como me enfraqueceu. Como me fez quebrar a guitarra que guardei dinheiro durantes meses e meses para comprar. Como me fez chorar como um garoto na frente de uma mulher que foi capaz de acabar comigo. Da maneira como eu não conseguia fingir que estava bem e naquele dia quando você foi embora eu chorei antes da sua sombra desaparecer entre as arvores, mas você sequer olhou para trás...
As lágrimas começaram a derramar do meu rosto enquanto ele se mantinha sereno mesmo me dizendo tudo aquilo. Ou me culpando, não tenho certeza qual termo melhor definiria.
- Eu nunca fiz o certo e nunca fiz o melhor para você.
- Você fez. Eu me reconstitui. Exatamente por isso, eu quero ir embora.
A frase acabou, eu engoli seco, o garçom chegou. Ele pegou o troco, se levantou e por pura educação esperou eu fazer o mesmo. Fiz e quando saímos do restaurante ele me olhou. Sorriu amarelo.
- Boa noite garotinha.
Veio em minha direção, me abraçou enquanto eu estática mal sabia o que fazer. Me beijou a testa enquanto segurava com as mãos os meus braços. Eu tremi ao seu toque e ele reparou. Olhou para baixo em uma risada debochada. Olhou para o outro como quem procura algo ou só quem foge a todo custo do meu rosto paralisado.
- Vamos, eu te levo para casa.
Pegou minha mão, olhando para baixo.
- Achei que quisesse ir embora.
- Você me expulsou e jogou minhas roupas pela janela, é claro que eu quero ir embora. Eu não tive escolha.
- Acho melhor fazermos esse trajeto em silêncio.
- Medo da fraqueza? Medo de outra fraqueza?
Me olhou com o mesmo olhar cínico que fez no nosso primeiro encontro e então riu como se comemorasse uma vitória. Aliás, ria de alguns em alguns minutos desde que saímos do restaurante. Como se escondesse o motivo da felicidade e apenas compartilhasse em silêncio com os meus pelos do braço arrepiados.
- Boa noite. Fique bem, garotinha.
Concordei com a cabeça, rodei a chave na porta enquanto ele me virava as costas e ia embora. Quando abri a porta ele se virou e me chamou já distante. Olhei.
- Obrigada. Obrigada por ter sido forte por nós dois.
Nossos problemas sempre foram resolvidos com a submissão dos diálogos. A forma de conversar subentendidamente, a troca de olhares que vinham com legenda. Meu orgulho queria ouvir, mas para mim só cabia o seu sorriso.
- Boa noite.

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